Mesmo em uma época na qual muitos apontam que a TV está perdendo a sua força para outras tecnologias e meios de distribuição de conteúdo, os realities seguem como um dos formatos mais consolidados, e ironicamente, é um dos temas que mais geram repercussão nas redes sociais.
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Há diversos formatos de realities de sucesso no Brasil, mas ainda são os de confinamento que rendem as maiores audiências e dão o que falar por aqui. O BBB (mesmo com as críticas à 19ª temporada) e A Fazenda, por exemplo, seguem oferecendo um gás extra à Globo e a Record. Mas é curioso recordar como tudo isso teve início na TV brasileira, há 18 anos.
Silvio Santos, em mais uma de suas decisões repentinas, pôs no ar, no dia 21 de outubro de 2001, um programa intitulado Casa dos Artistas. Desde a manhã daquele domingo, despertava a atenção do telespectador algumas chamadas misteriosas que eram veiculadas pelo SBT, e que convidavam o público a “conhecer a intimidade dos artistas no dia-a-dia”.
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Um mês antes, sem muito tempo para um planejamento mais profundo, Silvio organizou uma pequena equipe, liderada pelo diretor Rodrigo Carelli (hoje o principal comandante dos realities da Record, incluindo A Fazenda), que mantinha mistério dentro do próprio SBT, e que chegava a atuar fora das dependências da emissora, entrevistando profissionais para a Casa dos Artistas. Com um orçamento de R$ 5 milhões, a emissora adaptou uma mansão no bairro do Morumbi, em São Paulo, próxima a casa de Silvio, com 33 câmeras e 35 microfones.
Hoje, os participantes de realities costumam assinar seus contratos com as emissoras com até meses de antecedência, mas naquela ocasião, a maioria dos doze participantes da Casa dos Artistas (Núbia Óliiver, Taiguara Nazaré, Bárbara Paz, Alexandre Frota, Leandro Lehart, Alessandra Iscattena, Mari Alexandre, Marcelo Mastronelli, Mateus Carrieri, Supla, Nana Gouvea e Patrícia Coelho) fecharam um vínculo com o SBT apenas uma semana antes da estreia.
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“Fui ao programa do Silvio, ele me chamou no camarim e perguntou se eu não queria participar de um reality show que eu nem sabia o que era nem ele podia explicar”, declarou Mari Alexandre, em entrevista ao UOL, em 2016.
“Só falaram que não era novela. Tinha que trabalhar e topei, assinei um contrato de confidencialidade. Foi secreto mesmo”, afirmou Taiguara.
SUCESSO E CONFRONTO
A estratégia funcionou, e o público, curioso para conferir aquela novidade, fez a audiência da Casa dos Artistas bombar logo em seu lançamento, chegando a derrotar o Fantástico, da Globo, por 31 a 28 pontos.
O programa seguia em alta mesmo durante a semana, e chegava a registrar 20 pontos de média, número ainda acima dos padrões para o SBT. Porém, quem não se mostrou nenhum pouco satisfeito com esse sucesso da Casa dos Artistas foi a Globo. E o problema não era apenas as derrotas impostas na audiência.
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Dias após a estreia do reality, a emissora carioca passou a acusar o SBT de plágio e ameaçava abrir um processo. O canal dos Marinhos alegava que a Casa dos Artistas não passava de uma cópia do Big Brother, formato que a Globo comprou da produtora holandesa Endemol em 1999, e que ainda era inédito no Brasil. Na época, a imprensa divulgou que Silvio Santos chegou a negociar a compra do formato, e que obteve documentos que indicavam como o programa poderia ser realizado.
O SBT reagiu de forma surpreendente, e em um comunicado de tom extremamente irônico, com o título de “Não há direito a monopólio: a indústria brasileira do entretenimento só pode crescer se a TV Globo deixar”, a emissora de Silvio Santos detonou a concorrente.
“[…] Por tudo isso, é justo que a Globo nos processe, ainda que seja por plágio de um programa que não está sequer produzido. Será plágio por adivinhação, por premonição”, continuou a emissora, que ainda acusou a Globo de explorar o caso de sequestro de Silvio Santos e de Patrícia Abravanel, que ocorreu meses antes, através da TV e da venda de jornais do grupo.
No mesmo dia, a Globo respondeu ao comunicado do SBT: “A nota cheia de ressentimentos, distorções e desejo de destruir é, em vários trechos, o reconhecimento da capacidade de nossas equipes, porque, ao tentar denegri-las, não consegue deixar de citar os seus sucessos”, disparou a emissora.
“O lamentável, porém, nesse episódio, é sabermos que o SBT tem consciência do valor dos direitos que a TV Globo adquiriu, porque durante vários meses negociou esses mesmos direitos com a Endemol, teve acesso a todos os detalhes do formato agora copiado e, quando suas negociações fracassaram, comprometeu-se a não utilizá-los. O triste é vermos uma empresa demonstrar publicamente o orgulho de ser esperta e de usurpar o direito de terceiros”, continuou.
“Resta-nos a esperança de que a nota distribuída em nome da diretoria do SBT não represente, de fato, a forma como esses diretores pensam e agem”, finalizou.
GUERRA DECLARADA
Em 31 de outubro de 2001, dez dias após a estreia da Casa dos Artistas, a Globo “declarou guerra” ao SBT de forma definitiva, ao entrar com uma liminar, e conseguir, através da Justiça de Osasco, que o reality fosse retirado do ar. Caso a decisão fosse desrespeitada, a emissora de Silvio Santos teria de pagar uma multa de R$ 200 mil por dia.
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O SBT decidiu acatar a decisão, e às pressas, antecipou a exibição do Programa do Ratinho, e divulgou no horário da Casa dos Artistas, o seguinte comunicado: “Infelizmente não exibiremos hoje o programa Casa dos Artistas. A TV Globo, através de liminar concedida pela Justiça, impede o SBT de exibir o programa. Esperamos que a justiça prevaleça em favor de você, telespectador, para que em breve possamos continuar levando até você um programa de qualidade, como o Casa dos Artistas”.
No início do seu programa, Ratinho, sem papas na língua, soltou o verbo e ironizou a decisão da Globo de retirar a Casa dos Artistas do ar. “É uma barbaridade… Ninguém pode fazer sucesso no Brasil, só a Globo que pode”, disparou. “Nós vivemos num país de 160 milhões, em que o povo não manda nada! Quem manda é uma tal de ‘poderosa’”, completou.
https://www.youtube.com/watch?v=SNFk4EVGpmc
O programa chegou a ficar fora do ar por mais um dia, mas o SBT logo entrou com um recurso, que acabou sendo acatado pela justiça, e a atração finalmente retornou à TV. O que se viu nas semanas seguintes foi uma verdadeira batalha judicial entre as duas emissoras, com a Globo conseguindo mais uma liminar que impedia a exibição do reality, mas que a emissora de Silvio Santos ignorou. Até que no dia 6 de dezembro, o SBT teve sua primeira vitória, quando a justiça cassou definitivamente a liminar da Globo.
A ideia de Silvio Santos ao lançar a Casa dos Artistas não era exatamente derrotar o Fantástico, aos domingos, e sim No Limite, programa comandado por Zeca Camargo, e que foi, de fato, o primeiro reality da TV brasileira, mesmo que não tenha sido no formato de confinamento clássico. E aos poucos, o empresário realmente atingiu o seu objetivo, esvaziando o reality concorrente. Nas rodas de conversas (numa época em que as redes sociais sequer existiam), o assunto predominante era a Casa dos Artistas.
E no dia 16 de dezembro de 2001, o SBT finalmente levou ao ar a aguardada final do programa. Supla e Bárbara Paz, pioneiros entre os casais “queridinhos” do público, confirmaram o favoritismo, garantindo o primeiro e o segundo lugar — a atriz foi a grande campeã, levando o prêmio de R$ 300 mil.
A edição final registrou a incrível média de 47 pontos, com picos de 55, contra apenas 18 da Globo. Naquele momento, o reality entrava para a história como a maior audiência de todos os tempos do SBT, fato que emocionou Silvio Santos.
“Silvio ficou muito emocionado, chegamos a vê-lo chorar de emoção. Saiu lágrimas dos olhos dele”, revelou Patrícia Coelho, ao UOL.
“Ele falou: ‘O que aconteceu hoje nunca mais vai acontecer’. Sensação dele de que aquilo era um ápice. O choro da Bárbara foi muito impactante, tanto que ele se encantou por ela, chamou para ser protagonista de duas novelas. Ficou muito impressionado. Ele falava: ‘Isso é muito mais emocionante do que uma novela’”, contou Rodrigo Carelli.
A Globo não desistiu da ideia de provar que a Casa dos Artistas se tratava de uma cópia do Big Brother, e entrou com um novo processo contra o SBT, e que se arrastou por anos.
Mesmo tendo registrado a maior audiência da história do SBT, a Casa dos Artistas concretizou a “previsão” de Silvio Santos e não conseguiu alcançar os mesmos índices da primeira edição, ganhando apenas mais três temporadas, que pouco são lembradas pelo público. O reality foi encerrado definitivamente em 2004.
A Globo, por sua vez, tratou de estrear o BBB em 2002, poucas semanas após o fim da primeira Casa dos Artistas. O reality, como é do conhecimento de todos, segue firme rumo a sua vigésima temporada no próximo ano, e mesmo sem registrar a audiência de outras épocas, se mantém como um dos maiores faturamentos da emissora.
Em 2010, a Justiça finalmente considerou que a Casa dos Artistas se tratava de um plágio do Big Brother. Já em 2015, o Supremo Tribunal negou o último recurso do SBT na ação movida pela Globo, algo que gira em torno de R$ 18 milhões.
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